Thursday, October 6, 2011

Ku Jorge Carlos Fonseca

Em Maio último, fui convidado a participar num convívio "sabadal" de apoio a Jorge Carlos Fonseca à Presidência da República e, provavelmente, fazer algumas perguntas politicamente incorrectas. Acabei por não ir, mas enviei ao candidato algumas perguntas. Acabei por receber as respostas nestas férias de Agosto a que publico na íntegra:

O Jorge Carlos Fonseca foi um dos fundadores do partido Movimento para a Democracia (MPD), Ministro na primeira legislatura pós abertura democrática, e em 1993, por conflitos de ideais políticos, acabou por sair do MPD e associou-se a antigos colegas desse partido numa outra força política, o Partido da Convergência Democrática (PCD). Em 2000 candidatou-se como independente às eleições presidenciais e é esmagadoramente derrotado. Neste momento reconcilia-se com o MPD num contexto temporal onde Carlos Veiga aparece de novo como líder desse partido.

K-F: A sua candidatura é independente?

JCF: A candidatura presidencial é, por imposição constitucional, apartidária, como sabe. Para além de tal facto, realmente não pertenço, desde há alguns anos, a qualquer partido político.

K-F: Espera o apoio do MPD?

JCF: Sim, pelos contactos feitos até agora, pelo diálogo que tenho mantido, por minha iniciativa mas igualmente por impulso de muitos dirigentes políticos do MPD, a todos os níveis, de deputados nacionais e municipais, autarcas, militantes e simpatizantes, personalidades próximas do MPD ligadas ao mundo empresarial, universitário, cultural, vejo como uma possibilidade muito razoável um tal apoio. A simpatia pela candidatura demonstrada por esses sectores é alargada e forte.

K-F: Mesmo sabendo que a pessoa que tem o poder de decisão, relativamente ao apoio à sua candidatura (Carlos Veiga), poderá ter ele mesmo a ambição presidencial, tendo em conta que a última sondagem da Afro-sondagens aponta-o como o possível vencedor, caso resolva candidatar-se?

JCF: O Dr Carlos Veiga foi recentemente (re)eleito presidente do MPD e… pelo que verifico de leitura e audição de entrevistas do dr. Carlos Veiga, em variadíssimas ocasiões e em diferenciados órgãos de comunicação social, ele não é candidato presidencial… Disse-o até de forma muito enfática.

QUANTO ÀS SONDAGENS, penso que a sua pergunta parte de uma fé total em «sondagens», que não pretendo questionar de modo algum, apesar de haver por aí e de diferentes lados reservas ao teor e resultados delas…

K-F: Há vozes dentro do partido MPD que apontam Isaura Gomes como a provável candidata, caso Carlos Veiga não avance. Sendo assim, acha que o MPD vai apoiá-lo em detrimento da Isaura Gomes, sabendo que ela é uma figura popular e o Jorge Carlos Fonseca não o é, a não ser no seio de uma minoria intelectual?

JCF: Diz que JCF não é popular. O que significa popularidade? Será notoriedade? Olhe, por sinal, numa das últimas sondagens, realizadas por empresa especializada, a que tive acesso – e realizada bem antes de eu ter iniciado contactos tendo em vista este projecto de candidatura presidencial - a minha taxa de «notoriedade» era bem superior aos setenta por cento, creio que próxima dos 76 %. Isto é, era conhecido por 7,6 cabo-verdianos em cada dez. Não podem ser todos «intelectuais», seguramente. Isso seria óptimo para o país!!

Nada mau para quem estava e está fora da política activa há pelo menos 12 anos e não tem poiso institucional público há ainda mais tempo. Não sendo nem Presidente, nem governante, nem deputado, apenas apareço na comunicação social quando faço uma conferência, escrevo um livro, apresento uma revista. Aliás, uma tal índice já o tinha em vésperas das eleições de 2001, o que quer dizer que os votos obtidos (cerca de 5 mil) – realmente poucos – se deveram a razões e critérios outros que não essa ideia, esse pré-juízo de falta de popularidade. O que quer dizer que, tendencialmente, havendo uma campanha eleitoral bem concebida e realizada, e com apoios consistentes, esse índice pode rapidamente crescer.

A sua pergunta arranca de uma ideia-feita, lançada por alguns e que às vezes «pega», ainda que não seja real. Ela parte de uma ideia, que surge de alguns segmentos, nem sempre de forma ingénua, segundo a qual, sendo intelectual, porque escrevo, porque sendo universitário… não se é popular e não se pode ganhar eleições. Este raciocínio arranca evidentemente de um preconceito, infelizmente muito difundido entre nós, e, curioso, junto de intelectuais (alguns) e «quadros», o de que ser intelectual representa uma espécie de handicap social. Às vezes até parece que ser intelectual é ter… um defeito de carácter ou de personalidade, é ser um… marginal ou incapaz, uma capitis diminutio. E é fruto, resquício de certo tipo de ideologias que vêm no «trabalhador», nos «operários e camponeses» ou nas «massas populares» a exclusiva legitimidade para… a representação, digamos. É contra este tipo de preconceitos, de fantasmas, de algumas falsificações grosseiras, de absurdas avaliações que me tenho batido, tenho escrito. …

De alguma forma, mesmo em Cabo Verde e ultimamente, algumas mistificações foram estilhaçadas. Pense-se no que se dizia de Ulisses Silva quando defrontava Felisberto Vieira. O homem era «de gabinete», «tecnocrata», « não era conhecido nos belecos» e foi o que foi…

K-F: Sendo MPD um movimento com várias sensibilidades ideológicas, espera que os mais liberais apoiem-no, na medida em que é considerado por muitos um trotskista, devido ao seu passado político?

JCF: Esta dá-me um grande gozo para responder!! Estamos no séc. XXI e ainda se vem com a cantilena de trotskismo. Palavra de honra! Então eu – isto pode ser demonstrado documentalmente, por testemunhos, escritos, sei lá! – fui fundador, com outros, nos anos 80, 81 e 82, de «Círculos cabo-verdianos para a democracia» (CCPD), da Liga Cabo-Verdiana dos Direitos Humanos , fui MNE num Governo do MPD e… sou «trotskista? A política externa que o governo levou a cabo foi… trotskista??!! A Constituição de Cabo Verde, a de Timor-Leste, em cuja feitura pude dar uma pequena contribuição são … de matriz trotskista? Brincadeira… Trata-se de uma fantasia política, utilizada por alguns de forma interesseira, claro, mas pouco inteligente, para … não argumentar, para não discutir ideias. Imagino que alguns dos que falam disso nem sequer sabem o que é trotskismo e nunca leram uma linha de Trotsky. Bastaria ler o que tenho escrito em jornais, as crónicas, em revistas técnicas, em livros, sobre democracia, direitos fundamentais, constitucionalismo, Estado de direito, liberdades para ver que uma tal imputação no mínimo não é séria, nem é para levar a sério. Fazer uma avaliação a partir de dados de há mais de trinta anos é de facto uma postura estranha, esquisita… pelo menos.

Depois, fala-se em «liberais», em liberalismo… o que significa isso em rigor? Francamente eu não vejo em Cabo Verde muita gente a defender e escrever e assumir valores liberais, da democracia liberal como eu. Tenho de dizer isso com clareza e frontalidade.

K-F: Tendo em conta que em Cabo Verde reina um sistema bipartidário, onde os candidatos que se aventuram numa candidatura independente têm pouca expressão em termos de votos nas urnas, sente-se à mesma preparado para avançar sem o apoio do MPD? Não teme uma derrota como a que teve há dez anos atrás?

JCF: Eu não temo nada. Aliás, digo-lhe que nem de perto nem de longe estou arrependido da experiência de 2001. O contexto político é outro. Eu sou mais velho dez anos. Só avançarei para um projecto presidencial, como tenho repetido, partindo de condições propiciadoras de êxito eleitoral. Não que tenha de ganhar, nunca se pode ter uma tal certeza. Sempre fui um homem de causas e de combates, como deve saber, pela independência, desde os 17 anos e pela democracia contra o regime de partido único, o que me valeu dissabores. Mas, pelo que já lhe disse, pelos apoios que tenho tido e sentido na área política do MPD, na de outras forças políticas, como a UCID, mas também da sociedade cabo-verdiana no seu todo, penso poder ter tais condições favoráveis. No entanto, acentuo o facto de que uma candidatura presidencial no nosso sistema é individual, é pessoal, a decisão será sempre minha. Para usar uma expressão corriqueira, eu tenho de fazer o «meu trabalho, « a minha parte», os eleitores em Cabo verde não se resumem aos militantes dos partidos; o universo e a composição do tecido eleitoral são muito diferentes hoje do que eram em 2001. Temos hoje mais de 10 mil estudantes universitários em Cabo Verde…

Com trabalho, naturalmente, esforço, humildade, poderei potenciar aquelas condições de sucesso, inclusivamente o trabalho de vencer os fantasmas os preconceitos, as ideias feitas, e porque não dizê-lo, as falsidades que por vezes, aqui e ali, são usados, ora por ingenuidade, ora por má-fé e estratagema política.

Comentário: como se sabe, não pretendo votar nas próximas eleições, mas poderia votar neste contra o Inocêncio, ministro do asfalto. Obviamente, JCF força um apoio do MPD e mesmo tendo 10 mil estudantes universitários em Cabo Verde, há maiores probabilidades de se votar em partidos de que em indivíduos. É um facto. As sondagens valem o que valem e por aqui não valem quase nada, no entanto, há quem os leve em consideração e é um excelente instrumento de propaganda pré-eleições. Estou de acordo que há um preconceito contra os intelectuais e uma tendência em colar indivíduos ao passado (troksismos), mas isso tudo há de se ter em conta no dia D, porque, a verdade é que o povo vira-se sempre para o candidato populista e isso JCF não é nem consegue sê-lo por mais oleada esteja a sua máquina de apoio. Quer me parecer que, JCF parte em desvantagem porque Inocêncio (o candidato do PAICV) tem usado e bem usado a sua pasta de infraestrutura para conquistar votos no interior de Santiago e noutras ilhas, com inaugurações, populismos e afins. Ao contrário do que se diz, a meu ver, o MPD nunca foi liberalista pela asfixia democrática levado a cabo nos anos 90, o que penso ter ditado o afastamento do agora candidato. Penso que este (JCF) daria um bom árbitro da nossa infantil democracia...

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